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SER OU NÃO SER, EIS A QUESTÃO

William Shakespeare

"Hamlet"

Ser ou não ser, eis a questão. Será mais nobre em espírito viver

Sofrendo os golpes e as flechadas da afrontosa sorte

Ou armas tomar contra um mar de penas.

Dar-lhes um fim: morrer, dormir...

Só isso e, por tal sono, dizer que acabaram

Penas do coração e os milhões de choques naturais

Herdados com a carne? Será final. A desejar ardentemente...

Morrer, dormir;
Dormir, sonhar talvez...

Mas há um contra,
Pois nesse mortal sonho outros podem vir,

Libertos já do mortal abraço da vida...

Deve ser um intervalo... É o respeito

Que de tal longa vida faz calamidade

Pois quem pode suportar do tempo azorrague e chufas,

Os erros do tirano, ultrajes do orgulho,

As angústias de amor desprezado, a lei tardia,

A insolência das repartições e o coice destinado

Pelos inúteis aos meritórios pacientes?

Para quê se pode aquietar-se, acomodar-se,

Com um simples punhal?

Quem suportará,Suando e resmungando,vida de fadigas

Senão quem teme o horror de qualquer coisa após a morte,

País desconhecido, a descobrir, cujas fronteiras

Não há quem volte a atravessar e nos intriga

E nos faz continuar a suportar os nossos males

Em vez de fugir para outros que desconhecemos?...

Assim a todos nos faz covardes nossa consciência,

Assim o grito natural do ânimo mais resoluto

Se afoga na pálida sombra do pensar

E as empresas de mor peso e alto fim,

Tal vendo mudam o seu rumor errando

E nada conseguindo!

Sossega agora...

Ofélia gentil?

Ninfa, em tuas orações

Sejam sempre lembrados meus pecados.


Tradução de José Blanc de Portugal,Editorial Presença, 3ª. ed., 1997)WIILLIAM SHAKESPEARE(1564-1613)

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